acompanhar aqueles que acompanham!


2017.Out.29

Queridos Amigos.
Com amizade e saudade venho dar novas da minha missão por terras e por gentes sírias.

Antes de mais, partilho que a língua árabe começa a ser um terreno um pouco mais sólido onde me consigo mover com um pouco mais de facilidade.  O estudo continua a ocupar grande parte do meu tempo, mas há uma novidade no meu trabalho, propriamente dito.
Fouad (o meu companheiro SJ sírio, diretor do JRS-Syria) e eu pensámos que eu poderia trazer um maior beneficio se acompanhasse de algum modo os colaboradores (umas boas dezenas) do JRS, em Damasco. Que privilégio! Poder acompanhar aqueles que acompanham! Assim, o director fica mais liberto para questões mais “profissionais” e os colaboradores têm alguém com quem podem conversar sobre temas do foro mais humano e espiritual. Tem-se já verificado que foi uma boa escolha, e ser estrangeiro não traz impedimentos a uma transparência de corações.

A grande maioria dos colaboradores são jovens na idade universitária ou pós-universitária. Ter a bagagem preciosa do tanto que aprendi com os universitários e os K´s no CUMN em Coimbra e no CUPAV em Lisboa é uma mais valia nesta missão particular.

Começou-se por se propor workshops, para quem quisesse, sobre relações humanas e comunicação interpessoal. Comecei assim a “entrar” no mundo destes jovens tão iguais aos que fui conhecendo nestes últimos anos. Tão iguais e ao mesmo tempo tão diferentes!
Iguais porque têm a mesma linguagem de quem quer viver a pleno a vida; iguais porque trazem no olhar o mistério e o desejo de serem amados; iguais porque têm naturalmente em si o Sim do amanhã … apesar de tudo!

Mas ao mesmo tempo tão diferentes! Tiveram que reaprender a sonhar outros sonhos; alguns voltam agora a retomar o percurso universitário que foram obrigados a abandonar; muitos têm sobre si a responsabilidade de sustentar a família, outros a responsabilidade de reconstruir a vida sem a família.  Todos eles foram vitimas da guerra, uns de um modo mais dramático, outros menos. Muitos vieram de cidades devastadas pela guerra e encontraram aqui caminho para outras batalhas. As memórias recentes colocam a idade das inocências num tempo tão mais longínquo. Foi lhes tirado tanto. Se calhar por isso mesmo têm tanto para dar.
Poderíamos dizer: “São jovens, eles superam!” Damos por garantido a superação, só porque são jovens!? Habituámo-nos que seja prioritário a preocupação pelas crianças e as mulheres. E de facto, são precisamente as crianças e as mulheres que estes jovens acompanham diariamente. Mas, e eles? Os jovens? Os homens? Será verdade que superam, sem mais, só porque são jovens!? Só porque são homens?!
Tenho me apercebido como esta “verdade” tem tido um peso grande nas suas vidas, como se não bastasse a própria vida ter ganho o peso do mundo. É como se não pudessem permitir-se a estarem tristes e desanimados ou a terem fragilidades e medos. É como se não pudessem dizer que também precisam de alguém que os acompanhe e os abrace, para que possam eles acompanhar melhor e abraçar com mais força. De algum modo o meu papel é desmentir essa “verdade”. 

Acompanho-os e abraço-os. Também eles me acompanham e abraçam.
E é nesse abraço que vos coloco também,
Vosso, com amizade,



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