Ad Intra

22.Jul.'17
Querido Amigo

Já lá vai mais de uma semana que aterrei por terras do Médio Oriente. Será legitimo dizer que estou no meio do mundo? Às vezes penso que sim!

Deves estar curioso para saber o que já terei vivido. Se calhar vou desiludir-te... Não percorri grandes estradas ou caminhos nem fui a fronteiras. O que me foi dado a viver foi Ad Intra, i.e. "apenas" entre companheiros jesuítas. Mas, não sei se imaginas o imenso desse "apenas".

Cerca de 100 jesuitas da Provincia Jesuita do Proche-Orient encontraram-se durante uma semana para conversar sobre a província. E eu encontrei-me com eles. Há seis anos que este encontro não se realizava por força das circunstâncias... também da guerra! A geografia dos jesuítas do Proche-Orient vai da Turquia a Marrocos, passando pela Siria, Iraque, Jordania, Líbano, Egipto, Terra Santa, Argélia. Ora, a esta geografia também pertencem alguns que vêm de longe: India, Africa do Sul,  Indonésia, Australia, Mexico e Estados Unidos. E claro, da vizinha Europa: França, Espanha, Malta, Irlanda, Holanda, Bélgica, Polonia e agora, o nosso "jardim à beira mar plantado"!  Sou o mais novo, um velho benjamim que mal sabe soletrar o abecedário.

Em que língua se fala? Em Frances e em Árabe. O Árabe para mim ainda é um fronteira longínqua e difícil de ultrapassar. O Francês? Lentement! Mas ainda assim, fui conseguindo comunicar em todas as línguas que sei e mais umas outras tantas que não sei, sempre à lei do sorriso!

Cada dia encontrávamo-nos também no sacramento da eternidade que se faz alimento. De tantos "modos" diferentes: Ritos Maronita, Kopta, Grego Ortodoxo, Siriaco, Arménio, o Latino e se calhar mais algum que me tenha escapado... mas o único Absoluto, ali se fazia presente sempre. Admiravelmente! 


Parecia que estavam reunidos todos os ingredientes para ser uma verdadeira torre de babel. Não posso negar que tinha um pouco de babel e nas diferenças algumas divergências, mas o ar que se respirava era de Reino... aquele Reino revelado não muito longe daqui! Que profético! Num contexto de total intolerância ao que é diferente, de racismo, conflito, perseguição, violência... é possível viver o Reino! De onde vem esta força?! Do mistério do Amor que se faz pobre e humilde, que é perseguido, que morre... mas que vive sempre!

Deve ser o mesmo mistério que me fazia chegar ao fim de cada dia encontrado, mesmo quando me sentia perdido; que me fazia sentir em consolação mesmo na aridez; confortado mesmo no desconforto; sentir pertença mesmo deslocado; acompanhado mesmo na solidão; e ... em silêncio mesmo nos ruidos de babel!


Abraço forte, Ícaro


p.s.:Je remercie à Alexis, mon compagnon jésuite, qui est a Turquie, pour me avoir enseigné la beauté et profondeur espirituelle d'être un étranger.






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